sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Em Dois

Ao acordar ela é mais bela
Tem o corpo inteiro sorrindo
Pois ela é ela, e só, e é tudo
Tudo de bom que há em mim
É a minha vida se dividindo

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Espelho

É de prata meu espelho
Meu rosto refletido sob a lua
Atira-me à face da alma a fraqueza
Atiro-me aos pés ante a beleza sua

Sob a parreira sou meu passado em raiz
Frente ao vinho vê-se a verdade escondida
Satisfação saber da uva a matiz
Deleite aos lábios provar a fruta embebida

Abre-se a flor aos avessos olhares
Sábia madrugada aquela que o belo salva
Fruto que a estação a sóis viu surgir maduro

Tormenta vislumbrada aos ouvidos murmuro
Sob toques se perde a casca, a pele mostra-se alva
Clama o peito afogar-se em meus mares

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Amostra de humildade

Numa amostra impressionante de humildade, este blog abre espaço para um poeta novato mostrar seu trabalho. Um "rapaz" chamado Gonçalves Dias, ehehe.
Então com vocês, ei-lo:

Olhos Verdes

São uns olhos verdes, verdes,
Uns olhos de verde-mar,
Quando o tempo vai bonança;
Uns olhos cor de esperança,
Uns olhos por que morri;
Que ai de mim!
Nem já sei qual fiquei sendo
Depois que os vi!

Como duas esmeraldas,
Iguais na forma e na cor,
Têm luz mais branda e mais forte,
Diz uma - vida, outra - morte;
Uma - loucura, outra - amor.
Mas ai de mim!
Nem já sei qual fiquei sendo
Depois que os vi!

São verdes da cor do prado,
Exprimem qualquer paixão,
Tão facilmente se inflamam,
Tão meigamente derramam
Fogo e luz do coração
Mas ai de mim!
Nem já sei qual fiquei sendo
Depois que os vi!

São uns olhos verdes, verdes,
Que podem também brilhar;
Não são de um verde embaçado,
Mas verdes da cor do prado,
Mas verdes da cor do mar.
Mas ai de mim!
Nem já sei qual fiquei sendo
Depois que os vi!

Como se lê num espelho,
Pude ler nos olhos seus!
Os olhos mostram a alma,
Que as ondas postas em calma
Também refletem os céus;
Mas ai de mim!
Nem já sei qual fiquei sendo
Depois que os vi!

Dizei vós, ó meus amigos,
Se vos perguntam por mim,
Que eu vivo só da lembrança
De uns olhos cor de esperança,
De uns olhos verdes que vi!
Que ai de mim!
Nem já sei qual fiquei sendo
Depois que os vi!

Dizei vós: Triste do bardo!
Deixou-se de amor finar!
Viu uns olhos verdes, verdes,
uns olhos da cor do mar:
Eram verdes sem esp'rança,
Davam amor sem amar!
Dizei-o vós, meus amigos,
Que ai de mim!
Não pertenço mais à vida
Depois que os vi!

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Incerta

Bêbados pensamentos soltos no ar
Palavras enchem a boca, palavrões
Nada que enobreça o espírito ao falar
Cenas perdidas, devaneios de visões

Olhos de cor sempre indefinida
Há tempos têm-se visto cinza
Distantes na paisagem infinda
Sem brilho de brancas rosas lindas

Sorrisos raramente naturais
Como calor em restos de fogueira
Sem o fulgor de chamas fatais
A mente a queimar a alma enferma

Um ano de puro inverno, sem estações
Um presente que vive no futuro
Um passado descrito em canções
Um anjo abandonado no escuro

No escuro quarto da incerteza
No castelo perdido de uma lenda vazia
Nenhum sentimento se faz com clareza
Nenhum amor cabe em apenas uma poesia

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Inverno

Cabelos, louros e longos cabelos
A rolar por sobre as costas
Soltos aos sabores do vento
E verdes olhos (ou seriam azuis?)
Fazem mar
Seria alegria?
Tristeza cessou seu soprar?
O minuano o rosto castiga
As mãos colore
Tal qual faz do dia, escuro
No peito o passado vira folclore
Espessa e pesada roupa
Ao amor fez-se barricada
Igual se esvai o dia incolor
Mostram-se os olhos à frente
Sem fogo, paixão, dor
Ou qualquer coisa que esquente
Adormece o sentimento
Encontra em amigos único presente
Sob o peito aprisionado
Cavalo selvagem, indomado
Xucro volta a correr
Sabe ele voltará a amar
Sabe ele voltará a doer

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

O que Deixo de Esconder

Há tantas coisas que te quero dizer
Que a solidão dorme ao relento
Que a alegria é meu rebento
Que a felicidade é dúbia
E não te basta disso saber

Há coisas, eu sei, nunca te direi
Que a vida é simples ao extremo
Ao que saiba assim, a morte, há tempo
E, sabe ela, por tal, ela não temo
Pois sabemos ambos, sou eu quem vida doa
Àquilo que amo

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Aleatória

Não interessa quão grande o esforço
Vive o passado a rondar moribundo
Reza a oração, a canção
Pelo corpo a vagar
Em espírito, cabeça e coração
Que já não fala o que sabe
E já não sabe o que fala
E gira, gira, gira
Em minhas portas e janelas espia
Nada há de ser
Logo o ciclo se completa
Há de se abrir mão do cinza
Contemplar-se novamente
O azul, o amarelo e o verde
Vem a morna brisa polir
O brilho despertar
O encanto desprender
Em bases primitivas
Sob raízes da alma escondidas
De lágrimas a ferro protegidas
Vem provar da madeira a força
Do machado as investidas
Mostrar ao coração
Em você mesmo quem manda
Mas e o presente... por onde anda?

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Pálpebras do Tempo

Tenho os olhos cheios de memória
Da longa jornada que forjei
Das belas paisagens que vi
Das lisas faces que beijei

Tenho os olhos cansados
De falsidades com que sofri
De verdades que me magoaram
De moças por quem vivi
E morri

Tenho os lábios marcados
Dos momentos que me foram negados
Das palavras para as quais os fechei
Dos beijos que me foram roubados

Tenho os olhos leves
Da consciência que não me pesa
Dos sussurros que os acordam
Dos teus, que se abrem a revelar beleza

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Pena

Meu lápis te desenha,
Te molda em palavras
Te afaga, te ama, te mima
Por ti faz tudo o que pode
Só o que não sabe fazer
É um poema sem rima

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Ressábia

Corria sem medo pelo mundo
Um sorriso a lhe guiar
Um espelho perfeito da alma
Cravejado em esmeraldas a lhe encantar

Sonhos sem fronteiras cabíveis
Uma franca forma de jogar
Veneno contido em quaisquer palavras
Capaz da realidade fantasiar

Foi-se o guia, a chaga sangrou
Um anjo ao chão arremessado
Sem asas ou desejo em voar

Incrédulo à covardia que o atacou
Agora no escuro caminha amedrontado
E raramente põe-se a cantar

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Sim

Meu amor não cabe em mim
Vai muito além de pensamento
Se amar é minha sina, ao fim
Hei de amar ainda que
Apenas por um momento
Somente o tempo de um sim

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Quase Metade

Em parte tudo é verdade
O amor, a dor, o fogo que aquece mas não arde
A vida na Terra e afora
As passadas, reencarnadas
A morte após a morte
Fique comigo ou vá-se embora
Meias mentiras deslavadas, transparentes
Meia sola, meia boca
Alicerces de madeira, sob prédios pendentes
Dinheiro não é tudo
Felicidade não traz
Há de se ter beleza
Certeza
De que falta não se faz

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Rei dos Animais

Eu, jovem que sou
Não tenho grandes paixões avassaladoras
Guardo-as para quando ficar velho
Para poder dizer aos curiosos
Quando questionado
Na chegada ao paraíso
Que morri foi de amor...
... e matar todos de inveja!!

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Ilex Paraguaiensis

Segue afinado o instinto
A guiar-se pelo faro
Deixando-se envolver por aromas diversos
De flores, cores
De frutas e seus sabores
Cantigas e versos
Retos, corretos
Em rodas de mate
Rodando de mão em mão
Entre pais, filhos e netos

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Silêncio

O silêncio é ensurdecedor
É Maracanã de 50
É a morte de Senna
É um grito ardido, antigo
Uma das crias da vida
Traz a história nas notas
Em turvas estradas tortas
O silêncio é plural, disforme
Substitui quaisquer palavras
É visto, lido
Em olhos tristes, lágrimas faladas
É a questão maior do ser
É o contra-ponto do viver
Contenta-se com o quase nada
Porque assim é o silêncio
E assim o é você